quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Divórcio


Ontem divorciei um casal. Duas pessoas novas, interessantes, inteligentes. Casados há 16 anos. Amigos de infância. Começaram a namorar quando ela tinha 17 anos. Depois de cinco anos de namoro e algumas idas e vindas, casaram. Viveram felizes enquanto durou. Adotaram dois filhos, que criaram (e criam) com todo o amor do mundo. Um belo dia, decidiram que não conseguiriam mais viver juntos, por incompatibilidades várias que não vêm ao caso.

Encontrei os dois alguns minutos antes da audiência. Abraçaram-se, beijaram-se, conversaram. Deram risadas, perguntaram um da vida do outro. Uma das primeiras perguntas dele foi onde tinham ficado as crianças, enquanto ela tinha ido ao fórum. O carinho daquele pai, por aqueles dois meninos, escancarado na cara.

A audiência, pra variar, atrasou um pouco. Enquanto isso, ficamos conversando. Ela, uma mulher carinhosa e com uma inteligência emocional gritante; ele, um pouco mais reservado, como no geral são os homens, mas não menos carinhoso. Começaram a falar sobre a estranheza da situação. Sobre estarem sentados ali, conversando amenidades, enquanto não vinha a hora de romper o vínculo que os uniu por 16 anos... como se fosse a coisa mais banal do mundo.

No meio do papo, uma coisa que ela disse pra ele me marcou: "começamos amigos, casamos, construímos uma vida e fomos marido e mulher... agora estamos nos divorciando, e nos tornamos amigos de novo, e assim seremos pro resto das nossas vidas, pelos nossos filhos". Eu, com o meu óculos cor-de-rosa tradicional, achei lindo. Não o divórcio, claro. Mas fazer o quê? Não deu, não tinha como evitar. Pessoas mudam, se afastam, passam a gostar de outras coisas, bola pra frente. O que me chamou muito a atenção foi o carinho dos dois, o respeito, a humanidade, a gentileza, super difícil de ver em casos como esse. Ela, inclusive, me disse que os filhos adoram dizer pros amiguinhos que "o pai e mãe são tri amigos!".

Não sou muito íntima da Martha Medeiros, mas esses tempos ela escreveu uma coluna interessante (até guardei o jornal, mas no meio da minha-bagunça-que-não-acaba-mais não achei), onde dizia que as crianças de hoje devem ser educadas de forma a crescerem sabendo que o amor pode não ser eterno, e que o rompimento do vínculo entre duas pessoas nem sempre significa o fracasso da relação, mas sim simboliza que ambas não estão mais vivendo em sintonia, tudo a fim de evitar que se tornem adultos frustrados, com medo de se envolverem. Achei que o pensamento cai justo como uma luva, pois o casal de ontem, ele e ela, são nada mais do que isso: duas pessoas que se conheceram, se identificaram, se amaram, deixaram de se amar, e hoje se respeitam e se gostam como amigos. Quer uma relação mais bem-sucedida que essa?

Deixei o fórum feliz e acreditando mais e mais que, não adianta negar, a beleza está nas pequenas coisas e nos grandes gestos.



8 comentários:

  1. Sensacional teu post! Bah, pelo jeito eu vou investir mais minutos das minhas leituras nesse blog...

    Se puder, dá uma passadinha lá no meu tb! Bjão

    Gustavo

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  2. Lendo as primeiras linhas, fica-se com aquele temor, como já dizia um velho amigo jurista, que duas pessoas nunca se conhecem até que a relação acabe, podem ter 1, 10 ou 50 anos de união, mas na hora do rompimento parece que nunca passaram um minuto juntos, mas voltando, o final é algo fabuloso desse casal, que coisa mais fabulosa, beijam-se, acariciam-se no final de um relacionamento, mas ficam amigos para sempre, isso é maravilhoso, acho que por isso o ser humando é o que é.

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  3. Lendo este post, me veio à cabeça uma música da India Airie que traduz exatamente o que acontece nesses casos, pois no fim das contas, para que tudo termine certo e exista esse respeito, deve haver o mútuo perdão.

    Aí vai um trecho:

    India Arie - The Heart Of The Matter


    I got the call today, I didn't wanna hear
    But I knew that it would come
    An old true friend of ours was talkin' on the phone
    She said you found someone
    And I thought of all the bad luck,
    And all the struggles we went through
    How I lost me and you lost you
    What are these voices outside love's open door
    Make us throw off our contentment
    And beg for something more?

    I've been learning to live without you now
    But I miss you sometimes
    The more I know, the less I understand
    All the things I thought I knew, I'm learning them again
    I've been tryin' to get down to the Heart of the Matter
    But my will gets weak
    And my thoughts seem to scatter
    But I think it's about forgiveness
    Forgiveness
    Even if, even if you don't love me anymore

    (...)

    Bjao

    Felipe

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  4. Oi, Gustavo! Quanto tempo, como tu achou o Blog??? Entrei no teu e achei bem bacana, vou acompanhar também. Beijos e manda notícias!!!

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  5. "[...]pois o casal de ontem, ele e ela, são nada mais do que isso: duas pessoas que se conheceram, se identificaram, se amaram, deixaram de se amar, e hoje se respeitam e se gostam como amigos."

    Essa tolerância e compreensão, acredito, é fundamental para não sucumbir ao velho chavão da "culpa" e do ressentimento. Enxergar o outro como sere humano, e não como "a razão pela qual não deu certo" ou como "os motivos da minha frustração". Seria mais legal e muito mais sadio se sempre fosse assim. (ó os óculos cor- de-rosa xD)

    Beijo

    Yass

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  6. Joaquim... Felipe, meu amigo queri do coração, sempre presente... Yass, maluquete que eu adoro... obrigada pelos comentários!

    É fato, a tolerância e a compreensão são indispensáveis, mas como é difíiiiiicil às vezes né?! Enxergar o outro como ser humano é o principal de tudo... acontece o mesmo com os nossos pais... temos mania de querer ficar jogando frustrações nos outros... whatever... um dia a gente chega lá.
    Beijos!

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  7. Querida Aline:

    Gostei muito do texto "Escolhas" postado no teu blog. Foste bem feliz em citar, ainda no início do texto, a frase "torna-te quem tu és", a qual lembro ter me marcado quando li "Quando Nietzsche chorou”.

    Também fiquei conhecendo um pouco mais de ti e da tua coragem em largar algo que não te era aprazível, em que pese a incerteza no futuro. Pois bem, já estás a colher os frutos dessa escolha, o que terá um reflexo positivo para sempre na tua vida. Já que uma frase de livre foi citada, eis esta: “quando havia dois caminhos a seguir escolhi o mais difícil; e isso fez toda a diferença”. (James Praagh – Em busca da espiritualidade).

    Que bom que, ainda tão jovem, já estás te tornando quem realmente és. Desejo, sinceramente, que continues firme nesse caminho.

    Beijos.

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  8. Perfeito seria se após o divórcio (uns dez anos após) vierem a se casar novamente. Descobrirem que a relação ideal era realmente essa que eles tinham...

    Pergunta:

    O que serão das relações próximas dessas duas pessoas? Alguém arrisca um palpite?

    Minha humilde opinião diz que nada pode adubar tanto uma relação como o tal "carinho pré-existente e sua prole"... se é mútuo, que mútuo seja...

    Aline... muito legal teu blog...
    um beijo

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