Embora vivamos em um país em que, desde 1988,
a lei máxima - a Constituição Federal - diga que homens e mulheres são iguais
em direitos e obrigações, inclusive no exercício de seus papeis no casamento e
na união estável, a realidade social e das famílias brasileiras ainda mostra
estatísticas distantes desse ideal de igualdade.
Historicamente, as mulheres tem lutado pelo
seu reconhecimento como cidadãs, sujeitos de direitos e também como mães. Nessa
busca, conquistaram direitos ao voto, ao divórcio, à educação, ao trabalho, à
liberdade sexual, ao planejamento familiar, à escolha sobre o parto e ao
exercício da autoridade sobre os filhos, dentre tantos outros.
A busca de uma maior igualdade entre os
membros da família, acompanhada da inserção da mulher no mercado de trabalho e
da repartição do ônus de prover o sustento da casa, tem feito com que, cada vez
mais, os homens abracem ativamente a criação, os cuidados e a educação dos
filhos, compartilhando responsabilidades das quais, em um passado recente, a
sociedade os excluía.
Com esse crescente envolvimento na vida dos
pequenos, os homens do século XXI surpreenderam-se sobre o quão prazerosa e
gratificante pode ser essa rotina. E, com essa descoberta, logo perceberam
que a legislação não estava preparada para acolhê-los.
A guarda dos filhos é um bom exemplo disso.
A guarda compartilhada entre os pais passou a
ter previsão legal apenas em 2008, passando a existir como uma possibilidade
para o Juiz, inclusive em casos de litígio.
A primeira norma que regulou a guarda de
filhos no Brasil foi um Decreto de 1890, que dizia que os filhos deveriam ser
entregues ao cônjuge "inocente" na separação (sim, houve um longo
tempo em que se discutia quem era o "culpado" pelo fim). Com o Código
Civil de 1916, o Estatuto da Mulher Casada, de 1962, e a Lei do Divórcio, de
1977, em maior ou menor grau o entendimento passou a ser de que, em caso de culpa
recíproca pela separação, os filhos deveriam permanecer sob a guarda materna.
Essa legislação, situada em um contexto social
favorável à discriminação entre os gêneros, permitiu que, durante mais de um
século, fosse construída pelos Tribunais uma forte tendência de, ocorrendo
separação ou divórcio, outorgar a guarda dos filhos naturalmente à mãe.
Com a Constituição Federal de 1988, atribuindo
a homens e mulheres direitos iguais, inclusive sobre a família, e
posteriormente com o Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, que passou
a tratar as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, foi ganhando
espaço a ideia de que, mais do que um direito dos pais, a guarda deveria ser
atribuída àquele que pudesse atender em melhores condições os interesses dos
filhos.
Em 2002, entrou em vigor um novo Código Civil,
que aboliu a culpa pelo fim do casamento como um fator determinante para a
fixação da guarda. Em 2008, esse Código sofreu uma alteração, que inovou com a
possibilidade de, mesmo em casos de litígio, o Juiz fixar a guarda
compartilhada dos filhos. Ainda assim, arraigados à tradição da guarda unilateral
materna, os Tribunais seguiram entendendo, em muitos casos, que a guarda
compartilhada só poderia ser fixada se houvesse consenso entre os pais. Em
contrapartida, os interesses e as necessidades dos filhos passaram a ter um
peso muito grande nas disputas, sendo via de regra o fator decisivo para os
Juízes.
Insatisfeitos com esse modelo, os pais e a
sociedade buscaram uma resposta, que culminou com a edição da Lei nº 13.058/2014,
que entrou em vigor em 22 de dezembro de 2014, dispondo que a guarda
compartilhada deve ser sempre a primeira opção do Juiz, mesmo nos casos em que
haja desavenças entre os pais, desde que, claro, os dois queiram exercê-la.
A guarda compartilhada não significa fracionar
o tempo com os filhos em iguais partes, tampouco fazer com que a criança se confunda
entre duas residências; o "compartilhamento" está ligado às
responsabilidades sobre os filhos e às decisões sobre a sua criação e educação.
Trata-se de um instrumento que, ao mesmo tempo em que propicia aos pais uma
maior contribuição no dia-a-dia dos pequenos, cria o efeito de chamar o outro a
cumprir de forma mais satisfatória com as suas obrigações.
O efeito dessa legislação pode vir a ser muito
positivo, se considerarmos que, segundo dados do IBGE, o percentual de famílias
chefiadas por mulheres sem cônjuge no país passou de 24,9% para 38,7%, entre
2000 e 2010. Em tempos de crise do valor "responsabilidade", portanto,
cresce o número de mães solteiras pelo país.
O resgate da responsabilidade parental também
teve um grande estímulo com a promulgação da Lei da Alienação Parental, em
2010, que passou a condenar a conduta daquele pai (leia-se aqui pais e mães)
que interfere na formação psicológica dos filhos, promovendo atos que os façam
repudiar o outro genitor ou que causem prejuízo ao estabelecimento ou
manutenção dos vínculos familiares. Alienação parental não é crime, mas pode
ser punida sim, com sanções que vão desde a advertência de quem a pratica, até a
fixação de multa, alteração da guarda e suspensão da autoridade parental,
dentre outras.
Para os pais que tem regulamentado apenas o
direito de visitas e sofriam com a influência má intencionada do outro sobre os
filhos, esse foi um grande ganho.
Hoje, inclusive, há correntes que falam em substituir
a expressão "visitas" por convivência, justamente com a intenção de
chamar o não-guardião ativamente para a vida do filho, na condição de
protagonista, e não apenas de mero espectador.
Há, assim, um movimento crescente que tenta
inserir os pais (e, aqui, leia-se com maior força os "papais", por
uma questão cultural e histórica) de forma ativa na vida dos filhos, propiciando-lhes
as delícias da convivência e também chamando-lhes à responsabilidade integral
sobre os filhos. Um grande números de pais, por sua vez, tem buscado essa
convivência, usando os instrumentos que a lei lhes dá.
Essa onda é consequência da evolução
permanente da sociedade, que hoje busca com força igualar as condições entre os
gêneros e preocupa-se, cada vez mais (que bom!) em colocar os interesses das
crianças, esses seres tão vulneráveis, na frente dos interesses dos adultos.
Todos ganham com a valorização da paternidade.
Ponto para os pais que se esforçam diariamente para trazer e manter o assunto à
tona e que buscam no convívio com os filhos não só uma forma de realização
pessoal, mas também a concretização de sua responsabilidade parental, a
colaboração com o ex-parceiro e, acima de tudo, o desenvolvimento saudável dos
seus rebentos, em relações nutridas com afeto e respeito.
Que, nesse Dia dos Pais, entre abraços e
carinhos dos papais e dos filhos, todos façamos um exercício de conscientização
sobre a importância da paternidade na formação das crianças.
Um grande abraço!
Aline Kopplin.
* Esse texto foi publicado no site "Fofoca de Mãe" (www.fofocademae.com.br, @fofocadmae), onde agora tenho um espaço quinzenal.
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