segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Nova lei para uma velha omissão*

"Em breve, a Lei nº 12.010, de 29 de julho de 2009, entrará em vigor. É comum colocarmos na lei a responsabilidade por nossas omissões e frustrações. Mas, o que é a lei? Para que serve a lei?
A lei é produto humano, mais precisamente do Poder Legislativo, responsável por sua elaboração e que se espera, atenda justas reivindicações de uma sociedade ou de uma parcela sua de um determinado tempo histórico.
No passado recente, entendia-se que a instituição abrigo era a melhor alternativa para a criança cuja família fosse pobre ou apresentasse problema decorrente basicamente da pobreza. Colocávamos, neste tempo, a raiz do problema na família, eximindo todos os demais segmentos sociais de qualquer responsabilidade.
Nas últimas duas décadas, percebemos o fracasso da proposta: estávamos errados e era necessário mudar. Em 1988, nossa Constituição Federal elege a dignidade da pessoa humana como princípio norteador, guindando necessidades à categoria de direitos, distribuindo a responsabilidade pela sua garantia à família, à sociedade e ao poder público.
É comum resistirmos à mudança, mesmo que ela decorra de uma assembleia geral constituinte. De lá para cá, são vinte anos de acertos e desacertos, avanços e retrocessos. Entre os avanços, neste clima de desacomodação provocado pela mudança da matriz constitucional, passamos a voltar nosso olhar com mais vigor às crianças, em especial, para aquelas que têm seus direitos fundamentais ameaçados ou violados. O Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, sinaliza para a importância de inúmeros direitos constitucionalmente assegurados à criança e ao adolescente, entre eles, o direito à convivência familiar.
Abrigos gigantescos foram transformados em pequenas instituições, mais humanos, mais cuidados, mais voltados aos novos direitos. Atualmente, oitenta mil lá vivem, lá moram, lá esperam a chegada da tão sonhada família. Família que foi tão desprezada, tão maltratada, criminalizada, inclusive, dsde o tempo em que o estado retirava-lhe suas crianças porque ela era pobre, porque a casa não apresentava condições de higiene e habitabilidade. Tiramos as crianças da família. As crianças cresceram, formaram família, abandonaram, abusaram, negligenciaram nos cuidados com seus próprios filhos que, por sua vez, foram parar no abrigo.
O que fazer? Certamente muito há a fazer, muito há a mudar. Nova lei chega, valorizando agora a família natural, a família ampliada, impondo ao estado a responsabilidade por orientar, apoiar, promover socialmente o grupo familiar. A omissão é velha, mas a lei e o desafio são novos. Exige mudança, exige trabalho, exige maior participação da sociedade, maior aproximação entre os dois mundos, o mundo das crianças abandonadas com o mundo dos querem enfrentar o abandono. Mãos à obra!"
*Fonte: www.ibdfam.org.br (Nova lei para uma velha omissão - 10/08/2009 - Autora: Maria Regina Fay de Azambuja, procuradora de Justiça e professora da PUC-RS).

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Vertigem


* Por Aline Kopplin
Ao entrar pela porta do bar, passando pelo luminoso que brilhava azul-vermelho-azul-vermelho, respirou fundo e engoliu o choro. Passara a noite perambulando pela cidade. Tinha um buraco no peito e a garganta seca.
Lembrou daquele escritor que morreu cedo, que dizia que as pessoas são abismos, e que chegar perto dá vertigem. Parou, com raiva de si mesma. Na merda, e ainda filosofando. Maldita cabeça que pensava em círculos, sem sossego.
Atravessou o salão, sentou-se no bar e pediu uma dose de vodka. Vestia uma camiseta dele que tinha encolhido, jaqueta de couro preta, calça justa e botas de cano curto. Trazia uma bolsa grande cor-de-laranja a tiracolo e uma sacola cheia de revistas, que carregava com força desde o fim da tarde, quando saíra do trabalho, tomara um táxi e fora direto para o apartamento dele, no prédio velho da rua calma daquele bairro cheio de árvores, onde tantas vezes eles passearam de mãos dadas.
A unha, pintada de preto, havia levemente descascado. Há horas não retocava o rímel, borrado e que lhe dava ares de abatida. Bebeu de um tiro só. Pediu outra. Conferiu na carteira quanto ainda lhe restava. Pouco, mas suficiente pra pagar o táxi até lugar nenhum.
Pensou no desencontro que era sua vida, cheia de indefinições. Lembrou dele. Dele, e do que sentiu quando o conheceu. Da ternura que sentia todos os dias de manhã, quando acordava e via ele ali, do lado, espreguiçando-se com cara de sono. Das tantas promessas que fizeram. Das noites mal dormidas, das brigas interrompidas por loucas reconciliações, da sensação de calor que lhe dava toda vez que ouvia a voz dele no telefone. Pensou nele, por longo tempo. Nele... e nela. Ela, a estranha que roubara sua alma. Não segurou o soluço. Estancou o choro com mais uma dose.
Olhou em torno e viu que, àquela altura, restavam poucas pessoas no bar... uma turma barulhenta no canto, jogando sinuca e bebendo cerveja barata... um casal sentado perto da saída - ela aparentemente muito mais velha que ele... e meia de dúzia de bêbados de gravata contando piadas, tomando uísque e cantando a garçonete, que já limpava as mesas e levantava as cadeiras. Sentiu uma leve tontura e alguma náusea. Já passava das quatro da manhã e ainda não havia comido nada, reflexo do enjoo que lhe invadiu quando, ao chegar mais cedo do que o previsto, girou a chave, abriu a porta do apartamento e deu de cara com um par de sapatos de salto, com a carteira dele caída ao lado.
Levantou e caminhou até o banheiro, lavou o rosto e molhou o pescoço, grudando sem querer uma mecha de cabelo na testa. Tinha a pele mais pálida do que o normal; os olhos caídos; a boca rachada de febre, de raiva, de ciúmes. Lembrou da mãe, que nem devia ter notado a sua ausência, já que era na casa dele que passava a maior parte do tempo.
Não se reconhecia no espelho. Havia perdido o ar malicioso de menina, o jeito de mulher segura. Via apenas melancolia. Sentiu nojo de si mesma, por não ter tomado nenhuma atitude, por ter sido tão fraca ao ponto de apenas sair correndo e chorando, cuidando pra não bater a porta e, assim, não ser descoberta, achando que, se não fosse vista, diminuiría o seu sofrimento. Não poderia nunca conviver com essa atitude, não condizia com seu modo de ser.
Remoendo a cena e pensando fixamente naqueles sapatos de salto, foi sendo tomada por uma sensação alucinante de raiva, que lhe arrepiou os pelos e lhe fez, num rompante, tomar a bolsa e sair batendo a porta, deixando pra trás a sacola de revistas. Pagou a conta direto no caixa e não quis saber das moedas do troco. Passou correndo pelo luminoso, chegou à beira da calçada e parou o primeiro táxi. Rumou em direção ao apartamento dele. Pelo retrovisor, o taxista lhe dava algumas olhadas curiosas, como quem se diverte com o espetáculo da dor alheia.
Dobrando a esquina do seu destino final, sentiu a náusea aumentar. Já não chorava mais, só sentia raiva, dele e de si mesma. E daqueles sapatos. Daqueles malditos sapatos pretos, lindos e aparentemente caros. Desceu em frente ao prédio. Pensou em todos os desaforos que diria. Tocou o interfone. Uma... duas... três vezes. Alguém atendeu. Era ele.
Ao ouvi-lo, seu peito parou. Tentou falar, mas a voz não saiu. Quis gritar, xingá-lo, mandá-lo longe, fazer chantagem emocional, implorar que ele se arrependesse. Quis que ele pedisse pra ela entrar, lhe pegasse no colo, passasse a mão no seu cabelo, lhe desse banho e fizesse amor devagarinho, embaixo das cobertas, dizendo que não tinha tido a menor importância, e que tudo ia passar, e que amanhã era sábado e que eles iam acordar juntos, escovar os dentes, sair pra rua e tomar café na padaria na esquina. Mas calou. Apenas calou. Uma lágrima solitária lhe escorreu pelo rosto, borrando o resto do rímel. Ajeitou a bolsa no ombro, puxou a camiseta curta, tossiu baixinho e desceu as escadas. Saiu caminhando pela rua. Pensou em sumir, desaparecer, parecia mais fácil.
Sabia, porém, que não resolveria nada assim. Que pra sumir, precisava ter grana, o que não tinha. Que precisaria deixar sua família pra trás, o que não conseguia. Que se sumisse, ele nunca mais ia saber dela, e quem sabe nunca iria se arrepender e voltar atrás rastejando e pedir desculpas e dizer que a dona do sapato nada mais era do que uma aventura pueril, e que ele nem gostava tanto assim de salto alto. Pensou nisso e em todas as hipóteses possíveis pra diminuir a dor. Não achou nenhuma solução imediata. Assim, tomou outro táxi e pediu que lhe deixasse em casa. Pagou com os trocados que restavam.
Ao chegar, deitou de roupa e após alguns minutos de choro convulsivo, adormeceu, aumentando a estatística mundial de corações partidos.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Divórcio pela internet

O PLS 464/2008, que permite que pedidos de separação e divórcio sejam feitos pela internet, foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Se aprovado, o PL, de autoria da senadora Patrícia Saboya, vai viabilizar a separação e o divórcio consensual, pela internet, para casais sem filhos menores ou incapazes. Na petição on line, deverão constar informações sobre a partilha dos bens comuns, pensão alimentícia e possível alteração de nomes.
Segundo o presidente do IBDFAM, Rodrigo da Cunha Pereira, o divórcio pela internet é uma evolução no Direito de Família. "O PL segue a tendência do Estado moderno atual que é a de favorecer a autonomia do sujeito, através da menor intervenção do Estado na vida privada do cidadão", argumenta.
No entendimento da advogada, Marilene Guimarães, associada ao IBDFAM, o PL não dispõe sobre o trabalho do advogado no procedimento eletrônico. Em comunicado encaminhado ao IBDFAM, a associada pretende mobilizar a classe advocatícia para reiterar a participação do profissional no processo virtual. O projeto, que segue a esteira da Lei 11.149, que cria procedimentos para informatização dos processos judiciais, vai agora para a análise da Câmara dos Deputados.PEC - Nessa mesma linha de promoção da autonomia do cidadão, está prevista para votação no Senado Federal, no dia 24/09, a PEC 28/09 que pretende retirar prazos e o instituto da separação judicial como etapa obrigatória para o pedido de divórcio.
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Fonte: Boletim eletrônico IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família - N° 123

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Agora é lei: recusa em fazer teste de DNA presume paternidade (31.07.09)

O presidente Lula sancionou ontem (30), a Lei n. 12.004, alterando a Lei nº 8.560, que regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento. A mudança na legislação reconhece a presunção de paternidade quando o suposto pai se recusar em se submeter a exame de DNA ou a qualquer outro meio científico de prova, quando estiver respondendo a processo de investigação de paternidade.Tal entendimento foi iniciado em julgamentos do TJRS e do STJ e por este sumulado desde novembro de 2004. A Súmula nº 301 estabeleceu, explicitamente, o que começou a ser delineado em 1998, no julgamento de um recurso especial: “em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”. Naquele recurso, o ministro gaúcho Ruy Rosado de Aguiar Júnior e demais ministros da 4ª Turma, concluiram que a recusa do investigado em submeter-se ao exame de DNA, marcado por dez vezes, ao longo de quatro anos, aliada à comprovação de relacionamento sexual entre o investigado e a mãe do menor gerara a presunção de veracidade das alegações do processo (REsp nº 135361). Na mesma Turma, no julgamento de um caso em que o suposto pai havia se recusado, por três vezes, a realizar o exame, o ministro Bueno de Souza afirmou que "a injustificável recusa do investigado em submeter-se ao exame de DNA induz presunção que milita contra a sua resignação”. Este caso é oriundo do RS e o investigado era um advogado porto-alegrense. (REsp nº 55958). A 3ª Turma , que junto com a 4ª Turma, integra a 2ª Seção, responsável pela apreciação das questões envolvendo Direito Privado também consolidou essa posição ao decidir que, “ante o princípio da garantia da paternidade responsável, revela-se imprescindível, no caso, a realização do exame de DNA, sendo que a recusa do réu de submeter-se a tal exame gera a presunção da paternidade”, conforme acórdão da relatoria da ministra Nancy Andrighi (REsp nº 256261). Essa mesma Turma julgou, em 2000, um recurso em que o suporto pai se recusou, por dez vezes a se submeter ao exame. O relator, ministro Antonio de Pádua Ribeiro, aplicou o mesmo entendimento em um caso do Amazonas, no qual, somadas à recusa, há provas do relacionamento sexual e de fidelidade no período da concepção da criança e de honestidade da mãe (REsp nº 141689). A matéria se tornou lei após o Congresso Nacional aprovar o PLC nº 31/2007, originário da Câmara dos Deputados. A Lei nº 8.560/1992 determina que, em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e o nome e prenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, visando à verificação oficiosa da legitimidade da alegação. Se o suposto pai não atender, no prazo de 30 dias, a notificação judicial, ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá os autos ao representante do Ministério Público para que intente, havendo elementos suficientes, a ação de investigação de paternidade. A lei sancionada esta semana acrescenta à Lei nº 8.560/1992 o artigo 2º-A e seu parágrafo único, os quais têm a seguinte redação: "Art. 2º-A Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos. Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético – DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório”. Também está revogada a Lei nº 883, de 1949, legislação anterior que tratava nos filhos considerados ilegítimos, expressão rechaçada pela Carta Magna, que passou a denominá-los “filhos havidos fora do casamento”.
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quarta-feira, 22 de julho de 2009

Mãe perdeu a guarda do bebê antes de ele nascer

Uma mulher grávida, acusada de mendigar com seus filhos nas ruas de Nova Friburgo (RJ) perdeu a guarda de seu bebê antes mesmo de ele nascer. A decisão - anterior ao parto - foi do juiz da Vara da Infância e da Juventude da cidade, Marcos Vinícius Miranda Gonçalves. O bebê nasceu no último dia 8 e ficou na maternidade até a última sexta-feira (17). O magistrado determinou que fosse realizado um estudo para verificar a possibilidade de adoção da criança. No entanto, o TJ-RJ - deferindo efeito suspensivo a um agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público - suspendeu parcialmente a decisão do juiz. O TJ manteve a suspensão da guarda da mãe, mas encaminhou o bebê para um abrigo. “Ela já tinha uma ação para destituição do poder familiar dos outros filhos. Quando soubemos que estava grávida de novo, pedimos a inclusão da criança que estava por nascer, no processo. Ela já foi vista inúmeras vezes alcoolizada na rua, mendigando com as crianças. A pessoa continua com a mesma rotina que já foi prejudicial aos outros filhos. O pedido foi feito antes do nascimento para evitar que ela saísse da maternidade e desaparecesse” - contou a promotora Simone Gomes de Souza. As informações são do saite G1 - em texto da jornalista Alicia Uchoa. De acordo com a promotora, o TJ também determinou que seja realizado um estudo para verificar se realmente família da mãe biológica teria condições de ficar com a criança. Segundo ela, a mãe alega ter condições de ficar com o bebê.A mãe alega que esse pai é diferente do das outras e teria condições de exercer o poder familiar, com o auxílio de uma tia paterna, que ficaria com a guarda. "O tribunal suspendeu a decisão anterior antes mesmo da realização de um estudo para ouvir essa tia e ver se isso era realmente possível, e a criança foi para o abrigo”, explica a promotora Simone, acrescentando que a própria defensoria recorreu da decisão de deixar o bebê abrigado. De acordo com a promotora, um outro caso polêmico, decidido pelo mesmo juiz, mobilizou o Ministério Público da cidade este mês e já está em fase de recurso.“Poucos dias depois, nasceu o bebê de uma mãe igualmente complicada, o juiz determinou a suspensão do poder familiar, mas, sem mesmo haver processo, determinou a entrega da criança a um casal habilitado a adotar e a autorização para esse casal registrá-lo”, conta a promotora Simone Gomes de Souza.
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segunda-feira, 20 de julho de 2009

O lar que não chegou

Por Maria Berenice Dias, advogada (OAB-RS nº 74.024) e ex desembargadora do TJRS.
Recebida com euforia, a chamada Lei da Adoção, que busca reduzir o tempo de crianças e adolescentes institucionalizados, está cheia de propósitos, mas poucos são os avanços e quase nulas as chances de se esvaziarem os abrigos onde se encontram depositados 80 mil seres humanos à espera de um lar.
O projeto de lei, que aguarda sanção presidencial, confessa, no seu primeiro dispositivo, que a intervenção do Estado é prioritariamente voltada à orientação, apoio, promoção social da família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer. Somente em caso de absoluta impossibilidade, reconhecida por decisão judicial fundamentada, serão colocadas sob adoção, tutela ou guarda.
Ainda que nem se questione que o ideal é crianças e adolescentes crescerem junto a quem lhes trouxe ao mundo, há uma realidade que precisa ser arrostada sem medo. Quando isso se revela impossível ou é desaconselhável, melhor atende ao interesse de quem a família não deseja ou não tem condições de tê-los consigo é, com a maior brevidade possível, entregá-los a quem sonha reconhecê-los como seus filhos. A brevidade deste processo é o que melhor atende ao interesse de quem tem o direito à convivência familiar preservado constitucionalmente com absoluta prioridade (CF 227).
Para esse fim – e infelizmente – não se presta a nova legislação que nada mais fez do que burocratizar e emperrar o direito à adoção de quem teve a desdita de não ser acolhido no seio de sua família natural. Aliás, a lei traz um novo conceito, o de família extensa ou ampliada (25 parágrafo único): é a que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. E é ela que tem a preferência, devendo ser incluída em programa de orientação e auxílio (19 § 3º).
Talvez o primeiro percalço esteja em impor à gestante ou à mãe que deseje entregar filhos à adoção a necessidade de ser encaminhada à Justiça (13 parágrafo único). O consentimento para a adoção precisa ser precedido de esclarecimento prestado por equipe interprofissional, em especial, sobre a irrevogabilidade da medida (166 § 2º). O consentimento precisa ser colhido em audiência pelo juiz, com a presença do Minsitério Público, e isso depois de esgotados os esforços para a manutenção do filho junto à família natural ou extensa (166 § 3º). Ainda assim, até a data da publicação da sentença de adoção, o consentimento é retratável (166 § 5º) e não pode ser prestado por escrito (166 § 4º) e nem antes do nascimento da criança (166 § 6º).
Mas há outros entraves. Não é mais possível a dispensa do estágio de convivência, a não ser que o adotando esteja sob a tutela ou guarda legal do adotante (46 § 1º). Nem a guarda de fato autoriza a dispensa (46 § 2º), sendo que o estágio precisa ser acompanhado por equipe interprofissional, preferencialmente com apoio de técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, os quais deverão apresentar relatório minucioso (46 § 4º).
Além disso, a habilitação à adoção transformou-se em um processo (197-A), inclusive com petição inicial acompanhada de uma série de documentos, entre eles: comprovante de renda e de domicílio; atestado de sanidade física e mental; certidão de antecedentes criminais; e negativa de distribuição cível.
O Ministério Público pode requerer a designação de audiência para a ouvida dos postulantes e de testemunhas (197-B II). Com todas essas cautelas se afigura uma demasia condicionar a inscrição dos candidatos a um período de preparação psicossocial e jurídica (50 § 3º), mediante a frequência obrigatória a programa de preparação psicológica, orientação e estímulo à adoção inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos (197 § 1º).
Aliás, a título de disposições transitórias, é imposta a todos os figurantes no cadastro, no prazo máximo de um ano, a obrigação de sujeitarem-se à preparação psicossocial e jurídica, sob pena de cassação da inscrição (6º). Pelo jeito, a partir da entrada em vigor da nova lei, nenhuma adoção poderá ser deferida enquanto não se submeterem as pessoas já habilitadas ao indigitado procedimento preparatório. E, caso não seja disponibilizado dito programa pela justiça, no prazo legal, simplesmente todas as inscrições estarão automaticamente canceladas.
Mas há uma exigência que se afigura particularmente perversa. Incentivar, de forma obrigatória, o contato dos candidatos com crianças que se encontram institucionalizadas e em condições de serem adotados (50 § 4º). Além de expor as crianças à visitação, pode gerar nelas e em quem as quer adotar, falsas expectativas. Afinal, a visita é tão-só para candidatar-se à adoção, sendo que depois da habilitação terá que ser cadastrado em uma lista a ser obedecida quase que cegamente (197-E § 1º).
Aliás, uma das exceções à ordem de inscrição é no mínimo curiosa: quando o adotante detém a guarda legal de quem tem mais de três anos de idade (50 § 13 III).
Bem, falando em habilitação perdeu o legislador a bela chance de explicitamente admitir – como já vem fazendo a jurisprudência – a adoção homoparental. Nada, absolutamente nada justifica a omissão. Para conceder a adoção conjunta, de modo pouco técnico, fala a lei em “casados civilmente” (42 § 2º).
Também é confrontado o preceito constitucional ao ser exigida a comprovação documental da união estável (197-A III). De qualquer modo, tais dispositivos não vão impedir que as famílias homoafetivas continuem constituindo família com filhos por meio da adoção.
Diante de todos esses tropeços, de nada, ou de muito pouco adianta impor aos dirigentes das entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional que, a cada seis meses, encaminhem a juízo relatório (92 §2º), elaborado por equipe interprofissional ou interdisciplinar, para a reavaliação judicial das crianças e adolescentes em programas de acolhimento (19 § 1º).
Também sem chance de se tornar efetiva a limitação da permanência institucional em dois anos (19 § 2º). Às claras que não haverá como o juiz fundamentar que atende ao interesse da criança a necessidade de permanecer institucionalizada por prazo superior. A justificativa só será uma: não há onde colocá-los.
Do mesmo modo, garantir a tramitação prioritária dos processos, sob pena de responsabilidade (152 parágrafo único), mas não prever qualquer sanção outra, resta sem efeito prático impor a conclusão das ações de suspensão e perda do poder familiar no prazo máximo de 120 dias (163) e assegurar prioridade absoluta no julgamento dos recursos, que deve ocorrer no prazo de 60 dias (199-D), dispensada a revisão (199-C) e admitido parecer oral do Minsitério Público (199-D parágrafo único).
A adoção internacional, de fato, carecia de regulamentação. Mas foi tão exaustivamente disciplinada, impondo-se tantos entraves e exigências que, dificilmente, conseguirá alguém obtê-la. Até porque, o laudo de habilitação tem validade de, no máximo, um ano (52 VII). E, como só se dará a adoção internacional depois de esgotadas todas as possibilidades de colocação em família substituta brasileira e após consulta aos cadastros nacionais (51 II), havendo a preferência é de brasileiros residentes no exterior (51 § 2º), melhor seria, simplesmente, vetar a adoção internacional.
Claro que a lei tem méritos. Assegurar ao adotado o direito de conhecer sua origem biológica e acesso ao processo de adoção (48), é um deles. Aliás, tal já vinha sendo assegurado judicialmente. A manutenção de cadastros estaduais e nacional tanto de adotantes como de crianças aptas à adoção (50 5º) – o que já havia sido determinada pelo Conselho Nacional da Justiça (Res. 54/08) – é outro mecanismo que visa agilizar a adoção. Inclusive a inscrição nos cadastros deve ocorrer em 48 horas (50 § 8º), cabendo ao Ministério Público fiscalizá-los (50 § 12). Também é salutar assegurar preferência ao acolhimento familiar do que ao institucional (34 § 1º), bem como garantir aos pais o direito de visitas e a mantença do dever de prestar alimentos aos filhos quando colocados sob a guarda de terceiros (33 § 4º).
O fato é que a adoção transformou-se em medida excepcional, a qual deve se recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança e do adolescente na família natural ou extensa (39 § 1º).
Assim, a chamada lei da adoção, procura, por todos os lados é impedi-la, tanto que, onze vezes é feita referência à prioridade da família natural. Assim, para milhares de crianças e adolescentes que não têm um lar, continuará sendo apenas um sonho o direito assegurado constitucionalmente à convivência familiar.
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Fonte: www.espacovital.com.br

quinta-feira, 16 de julho de 2009

I did it my way



Boa madrugada! Estou caindo pelas tabelas, mas os lampejos vêm na minha cabeça e, se não escrevo, acaba passando a empolgação... tava revendo no youtube algumas cenas de filmes e outras bobagenzitas nerds internéticas e reencontrei uma cena de um documentário que me tocou muito muito muito muito muito (cinco muitos é suficiente).

Explico.

Ano passado vi no Santander Cultural o filme "Jogo de Cena", de Eduardo Coutinho, que mostra mulheres comuns e atrizes renomadas prestando depoimentos emocionados e contando histórias de vida, de forma tão tocante que fica difícil distinguir quem fala de si mesma e quem narra a vida de outra pessoa.

Fiquei encantada pela forma como o cara construiu a narrativa e a maneira como selecionou as histórias que dão fundamento ao filme: através de anúncios no jornal.

A partir daí, resolvi escarafunchar e descobri que o tal Eduardo Coutinho tinha feito um filme/documentário chamado "Edifício Master", de 2002, sobre o maior conjunto residencial urbano do Rio de Janeiro: o prédio tem 12 andares e 23 apartamentos por andar, somando um total de cerca de 500 moradores. O filme passeia pelos depoimentos de 37 moradores, cada um contando intimidades, detalhes de suas vidas, num cruzamento de humanidade que encanta e ao mesmo tempo choca, às vezes pela crueza, às vezes pela simplicidade, mas principalmente porque deixa expostas as semelhanças que unem uns aos outros. Tem desde ex-jogador de futebol frustrado e prostituta, até mãe solteira, imigrante, religioso, casal unido pela internet, uma salada bem bacana.

Longe de mim fazer crítica de cinema, ainda mais à essa altura da madrugada. Digo tudo isso só pra justificar o vídeo que achei no youtube, assisti e postei ali em cima. Tenho certeza que as almas sensíveis leitoras desse blog vão se interessar :o). Assistam, é muito bom mesmo.

Beijos e boa noite!